terça-feira, 22 de janeiro de 2008

ADORAÇÃO E MISSÃO

Ricardo Barbosa de Sousa

A adoração é a vocação primária e natural do cristão. A Confissão de Westminster afirma, no seu primeiro parágrafo, que o fim do homem é adorar a Deus e gozá-lo para sempre. Vale a pena citar estas palavras de William Temple: “Adoração é a submissão de todo o nosso ser a Deus. É tomar consciência de sua santidade; é o sustento da mente com sua verdade; é a purificação da imaginação por sua beleza; é a abertura do coração a seu amor; é a rendição da vontade a seus propósitos. E tudo isto se traduz em louvor, a mais íntima emoção, o melhor remédio para o egoísmo que é o pecado original.”

A igreja moderna limitou o ato da adoração ao culto e vem reduzindo-o ao ato de cantar e, em alguns casos, dançar. Adorar, para muitos cristãos, significa cantar na igreja, de preferência com os olhos fechados e as mãos levantadas. Apenas isto. Porém, quando consideramos o ensino bíblico, as confissões históricas e esta brilhante definição de William Temple, reconhecemos que a adoração abrange muito mais do que aquilo a que o pragmatismo moderno a reduziu.

Uma consideração importante para nossa compreensão da adoração é que Jesus Cristo é o único verdadeiro adorador, pois somente ele pôde oferecer a única oferta de adoração aceita por Deus, por ser absolutamente perfeita. Em sua vida de absoluta dependência e obediência, ele se ofereceu inteiramente ao Pai em sacrifício pelos nossos pecados. Ele se fez homem, tornou-se servo, foi obediente até a morte e morte de cruz. Pela perfeição da sua oferta, tornou-se sumo sacerdote para apresentar-nos a Deus e tornar a nossa oferta aceitável. Por meio de Cristo somos redimidos e reconciliados com Deus para uma vida de comunhão e adoração. Ele é o nosso mediador, que leva consigo nossas dores e pesares, bem como nossas alegrias e esperanças, nossas orações e súplicas e as apresenta como nosso intercessor diante do Pai. Aquilo que nós falhamos em fazer por causa do pecado, ele agora realiza por nós, em nosso lugar, tornando nossa oferta, em seu nome, agradável a Deus. Ele coloca-se em nosso lugar diante do Pai a fim de redimir nossa falência, e pelo seu Espírito nos ajuda em nossas fraquezas porque não sabemos orar como convém.

A adoração de Cristo foi sua resposta amorosa e obediente ao Pai. Por meio de sua obra na cruz ele fez de nós sua igreja e seu povo, e nos chama para sermos um novo sacerdócio a fim de oferecermos sacrifícios espirituais em seu nome. A adoração de Cristo é a obra que ele realiza ao trazer a criação de volta aos propósitos do Criador. Portanto, qualquer que seja a nossa adoração, ela deverá ser sempre um litúrgico amém à adoração de Cristo.

Ao reduzirmos nossa compreensão da adoração ao que fazemos na igreja quando cantamos, limitamos nossa participação naquilo que Cristo fez e continua fazendo em sua obra redentora. Adorar, tendo diante de nós o Filho de Deus encarnado, nos leva a reconhecer que o ato da adoração envolve a nossa participação na mesma obra de Cristo. Adorar é viver em obediência a Cristo. É por isso que o apóstolo Paulo faz este veemente apelo: “Rogo-vos, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, que apresenteis os vossos corpos por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional.” Para ele, adorar é a entrega de todo o nosso ser em oferta obediente a Deus por meio de Cristo.

Ao reconhecermos que a única oferta que Deus aceita é a de seu Filho, a oferta que apresentamos a ele é a nossa participação na oferta de seu Filho quando, em obediência e amor, nos entregamos a ele e participamos de sua obra redentora. Na definição de William Temple não vemos uma única referência a cantar ou dançar, mas que adorar é submeter todo o ser a Deus, nos render ao seu propósito, purificar a imaginação pela sua beleza, abrir o coração ao seu amor, desejar a santidade do seu caráter. É isto que encontramos em Cristo, nosso verdadeiro adorador, e é isto que o mundo espera encontrar em nós. Somos uma igreja que canta e dança muito bem, mas adorar é mais do que isto, é expressar no caráter e nas ações a beleza do Criador, é encarnar a missão de Cristo e participar de sua obra redentora. Foi para isto que ele nos criou e para isto que ele nos redimiu.

  • Ricardo Barbosa de Sousa é pastor da Igreja Presbiteriana do Planalto e coordenador do Centro Cristão de Estudos, em Brasília. É autor de Janelas para a Vida e O Caminho do Coração.

Missão Integral e Espiritualidade Transformadora num Mundo Pós-moderno

by Toni Melo

Pensar numa espiritualidade transformadora que não tenha o seu fim em si mesma, mas que viva um relacionamento de serviço a Deus e ao outro é também refletir sobre o exercício e a prática da missão integral. Isso, no nosso caso, se dá em meio à pós-modernidade e a todos os seus efeitos sobre a espiritualidade cristã.

É importante lembrarmos que a espiritualidade se dá no contexto da missão. Enquanto exercemos a missão somos impulsionados a nos relacionarmos com Deus e com o outro; esse movimento de serviço e amor torna a nossa espiritualidade um processo dinâmico que tem o seu impulso inicial em Deus. Assim, esse processo, terá por objetivo a transformação das nossas vidas, das que nos cercam, e a realização do próprio Deus na restauração da sua criação. Já, a espiritualidade pós-moderna tem como principal objetivo a satisfação pessoal, e se utiliza do sagrado para suprir de maneira individualista suas necessidades.

Não se pode pensar em espiritualidade sem pensar em transformação, conversão e serviço. A transformação da vida, a conversão do coração e o serviço ao outro. É característico de alguém que possui um genuíno relacionamento com Deus: a) novidade de vida, refletida na sua forma de viver os valores do Reino de Deus (2 Co 5.17); b) conversão do seu coração, que agora coloca todas as suas emoções sob o controle do Espírito de Deus (Fl 4. 4-9); e c) a sua vida de serviço e altruísmo ao próximo (Jo 13.1-17), refletindo de maneira concreta e real o caráter de Cristo.

É muito comum hoje, em meio ao pluralismo religioso que a pós-modernidade traz, vermos formas de espiritualidade baseadas nos estereótipos religiosos norte-americanos; nos monges da idade média; nos liberais que relativizam toda e qualquer prática normativa; nos “novos” adoradores ou adoradores extravagantes. Enfim, existe atualmente uma variedade de tipos de espiritualidade. Mas o que realmente falta hoje é uma sintonia dessas formas de espiritualidade com uma teologia bíblica e relevante para os nossos dias.

Uma espiritualidade baseada em estereótipos americanos ou europeus não cumpre muito o seu papel num povo possuidor de grandes problemas econômicos e sociais, além de alienar e adoecer a espiritualidade brasileira. Uma espiritualidade monástica que se isola numa solitude artificial e divorciada do caos urbano e relacional não oferece algo muito além de um gostoso descanso nas montanhas e de uma momentânea sensação de contemplação e comunhão com o sagrado. Uma espiritualidade liberal que não vê limites para suas relativizações e subjetivações das verdades bíblicas também não oferecerá muito, além de um bom desencargo de consciência, enquanto continua-se vivendo num relacionamento raso e pouco significativo com Deus. Uma espiritualidade dita “extravagante”, mas que não tem o mínimo interesse em extravasar no serviço à sociedade e na prática da justiça, por se achar pura demais para se envolver com o mundo, também não tem muito a oferecer além de algumas experiências de êxtase e a pouco duradoura impressão de se estar próximo de Deus.

Não tenho aqui a intenção de simplesmente desconstruir tudo o que é feito ou acredita-se que é feito como espiritualidade. No entanto, julgo ser necessária uma mudança de mentalidade no que diz respeito ao real sentido da espiritualidade cristã. Não acredito numa espiritualidade divorciada do cotidiano da vida humana, que se isola em um gueto para poder ter sentido. Não acredito numa espiritualidade isolada da solidariedade, que celebra apenas crescimentos individuais.


http://crendoepensando.blogspot.com

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

ORANDO NO ESPELHO

Por: Rubem Amorese
http://www.amorese.com.br/


Precisamos orar pelo país. Temos esquecido de incluir o Brasil em nossos programas de oração. Deixamos nosso povo e nossos governantes sem cobertura.

Dá no que dá. Deus fez sua parte. Somos um país “abençoado por Deus”, com imensas riquezas naturais, terras férteis, clima ameno etc. Falta orar por nosso povo e por nossos governantes.

Penso logo numa lista de pedidos.

Gostaria de poder comprar jornal numa caixa na calçada, onde coloco o dinheiro e pego o jornal, sem necessidade de vigias. Gostaria de poder tirar uma simples cópia, sem ter que pedir ao encarregado da chave do armário do papel da copiadora.

Gostaria de não ter que trancar na gaveta, todo fim de expediente, meus papéis, réguas e canetas. Sem tranca, tudo desaparece, da noite para o dia.

Gostaria de ver os gramados de Brasília sem aquelas milhares de trilhas na grama. O povo não usa as calçadas que não coincidam com a linha reta que pretendem traçar ao seu destino.

Gostaria que meus vizinhos usassem a sua água para lavar o carro, e não fizessem “gatos” na água do condomínio. O mesmo para a luz, a tevê a cabo e até para linhas telefônicas.

Gostaria que as pessoas fossem pontuais. Que simplesmente chegassem na hora marcada. A gente perderia menos tempo na vida, esperando por gente que acha que tem o direito de nos fazer esperar (se reclamamos, dizem: “relaxa!”).

Gostaria que todos os motoristas que encontro nas ruas tivessem carteiras legítimas e soubessem as regras de trânsito. Que a compra de carteiras, certidões, diplomas, atestados e tudo o mais não fosse “normal”.

Gostaria que alguém se escandalizasse quando um político entra de licença médica, como recurso “de praxe” para se afastar. Que alguém pedisse uma junta médica para verificar se ele realmente está doente.

Gostaria que meu presidente soubesse alguma coisa do que se passa fora do seu gabinete; no país que diz governar, por exemplo. Mas ele repete que não sabia. Gostaria que Roberto Jefferson e Fernando Collor não mais se apresentassem como “garotos-propaganda” de um partido, como se fossem referências nacionais.

Gostaria que Marta Suplicy deixasse de pensar só “naquilo”. Em especial, quando se fala de crise na aviação. “Relaxar e gozar” durante um estupro, na boca de uma ministra de estado só pode ser o fundo do poço moral de uma nação. Se ela não puder mais ser mudada (nem com oração), que seja retirada do cargo.

Quanta matéria de oração, para melhorar nosso país! Imagino que lhe ocorram muitas outras, leitor.
Será que Deus consegue?

Bem, a resposta encontraremos no espelho. Ao pensar nesses “pedidos de oração”, vale perguntar: é por essa imagem no espelho que estou orando? Não seria o caso de usar, então, “nós”, como fez Neemias?

Estejam, pois, atentos os teus ouvidos, e os teus olhos, abertos, para acudires à oração do teu servo, que hoje faço à tua presença, dia e noite, pelos filhos de Israel, teus servos; e faço confissão pelos pecados dos filhos de Israel, os quais temos cometido contra ti; pois eu e a casa de meu pai temos pecado. Temos procedido de todo corruptamente contra ti, não temos guardado os mandamentos, nem os estatutos, nem os juízos que ordenaste a Moisés, teu servo. Ne 1:6,7

Devemos orar pelo Brasil, sem dúvida. Deus, na sua misericórdia, responderá se, com temor, suplicarmos por esse rosto que vemos no espelho.